VIGÉSIMO
QUINTO DOMINGO COMUM (23.09.12)
Mc
9, 30-37
Na estrutura do Marcos, depois da chamada “Crise
Galilaica”, manifestada no episódio da Estada de Cesaréia de Felipe, Jesus muda
totalmente de tática e estratégia. Ele não anda mais com as multidões, quase
não faz mais milagres - dos 19 milagres em Marcos, somente dois acontecem
depois do acontecimento de Cesaréia. Em lugar disso, Ele se dedica quase
totalmente à formação dos seus discípulos, tentando inculcar neles as atitudes
de verdadeiros discípulos, ensinando-os que o Caminho d’Ele é o caminho da
Cruz, da entrega, da doação, e não da busca do poder, da glória ou da fama.
Marcos faz isso de uma maneira bem planejada. Em três ocasiões, Jesus anuncia a
sua futura paixão (8, 81; 9, 31; 10, 33-34). Em cada ocasião os discípulos não
compreendem (8, 32; 8, 34; 10, 35-37). E, a partir dessas incompreensões, Jesus
torna a dar um ensinamento, aprofundando vários aspectos do verdadeiro
seguimento d’Ele (8, 34-38; 9, 35-37; 10, 38-45).
O trecho de
hoje trata do segundo desses três acontecimentos. A causa da dificuldade é a
tentação do poder. Embora Jesus tenha deixado bem claro, pela segunda vez, que
o seguimento d’Ele é uma vida de entrega, até à morte, em favor dos outros, os
Doze discutem entre si qual deles era a maior! O poder é tentação permanente em
todas as comunidades, não isentando as Igrejas! Podemos até dizer, com certa
dose de humor, que a busca de poder está no DNA das pessoas humanas! Talvez
mais do que outro motivo, a sede do poder tem sido o que mais tem corrompido
nas Igrejas - mais ainda do que a imoralidade ou a ganância financeira. No
século dezenove, o estadista e historiador católico inglês Lord Acton falou que
“todo poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente”. E
não há poder mais perigoso do que o religioso, que fala em nome de Deus!
Quantos sofrimentos e males causados por essa
sede do poder, disfarçada como mandato de Deus! Desde o fundamentalismo
fanático do Talibã no Afeganistão, até a ufania de certos padres - mormente
recém ordenados - que se ostentam com roupas finas e carros do ano e, de uma
maneira opressora, dominam religiosas e leigos de muito mais experiência e sabedoria
do que eles... a sede do poder e da dominação, sempre em nome de Deus ou de
Jesus, continua a distorcer a vida de muitas comunidades religiosas, dentro e
fora do Cristianismo. Como escreveu o teólogo dominicano sul-africano Alberto
Nolan OP, “Jesus tem sido mais frequentemente honrado e venerado por aquilo que
ele não significou, do que por aquilo que ele realmente significou. A suprema
ironia é que algumas das coisas, às quais Ele mais fortemente se opôs na sua
época, foram ressuscitadas, pregadas e difundidas mais amplamente através do
mundo – em seu nome.” O poder-dominação é frequentemente um desses elementos.
Diante da
recusa dos seus discípulos em entender o seu ensinamento, Jesus, o Servo de
Javé, pega uma criança como símbolo de quem deve segui-Lo. Não porque criança é
sempre santa nem inocente! Mas porque é sem-poder, dependente dos adultos de
tudo. No tempo de Jesus, criança não tinha direitos e era entre os últimos da
sociedade. Os seus discípulos são convidados a despojar-se do poder para serem
servos, da mesma maneira do que o Mestre, Ele que “não se apegou à sua
igualdade com Deus. Pelo contrário, esvaziou-se a si mesmo, assumindo a
condição de servo e tornando-se semelhante aos homens. Assim, apresentando-se
como simples homem, humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até a morte,
e morte da cruz” (Fl 2, 6-8).
O poder em
si é um bem - para ser usado a serviço dos outros! Todos nós - clero,
religiosos, leigos - somos vulneráveis diante da tentação do poder. Levemos a
sério o ensinamento de hoje, pois só pode ser discípulo de Jesus quem procura
ser o servo de todos! Evitemos títulos, privilégios, e comportamentos que tão
facilmente poderão nos afastar do seguimento do Senhor. Que o nosso modelo seja
sempre Ele - e não os critérios da sociedade vigente, onde é o poder que manda.
A nossa força vem da Cruz de Jesus, a fraqueza do Deus “que escolheu o que o
mundo despreza, acha vil e sem valor, para destruir o que o mundo pensa que é
importante” (1Cor 1, 28).
Pe. Tomaz Hughes
SVD
E-mail: thughes@netpar.com.br
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